segunda-feira, 22 de junho de 2020

O que a professora Isabel Silva tem para nos contar



Rodrigo Bonina (RB), 10.º E, Desenho A
Gonçalo Filipe (GF), 10.ºE, Desenho  A 

RB Boa tarde professora Isabel Silva (PIS). Nós somos alunos do 10.º E, do Curso Geral de Artes, Gonçalo Filipe e Rodrigo Bonina. Gostaríamos de a entrevistar no âmbito de um trabalho para a disciplina de Desenho A e que irá ser publicado no blogartes. Antes de começar queremos agradecer a disponibilidade para nos receber.
PIS Bom dia para vocês também!
GF Qual foi o motivo que levou a Sra. professora a escolher esta área?
A minha área académica, de formação, é design gráfico.  Mal acabei o meu curso comecei a dar aulas. Já tinha dado, entretanto, formação a adultos e também a alunos da vossa faixa etária. Acabei o meu curso e decidi dar aulas. Adorei! E nunca mais deixei. É assim como uma paixão! 

RB Os seus parentes, nomeadamente os pais, apoiaram a sua escolha? 
PIS Sou uma pessoa muito feliz e devo isso aos meus pais. Para mim são os meus ídolos e os meus heróis!  Os meus pais sempre me apoiaram em tudo: no bem e no mal… sempre que fazia asneiradas, tentavam colocar-me no caminho certo, e nas coisas boas. O meu currículo é assim um bocado estranho: estive na área das engenharias, fiz um curso profissional de eletrotecnia e sistemas informáticos. Achei que não era aquilo que me realizava, me fazia realizar o meu sonho, que eram o design e as artes, era deles que queria fazer “o para a vida toda”. Então, cheguei ao fim do terceiro ano do curso profissional e tive uma conversa séria com os meus pais.  Eles nem sonhavam da minha ideia de mudar de curso… Disse-lhes que queria seguir o meu sonho! E apoiaram-me! Repeti o 12.º ano, porque precisei de algumas disciplinas para ingressar no curso.

GF Qual o seu estilo preferido?
PIS O meu estilo é muito livre! Estou ciente das coisas que faço e gosto imenso de desenhar! Sou uma sonhadora… gosto muito da parte de lettering, das letras! Sou um bocadinho como o mar, às vezes está calmo, às vezes faz uma verdadeira revolta. Não te rias Gonçalo, é sério!  Algumas vezes sou como um furacão: chego, monto a minha bancada e faço uma revolução enorme, nunca desisto dos meus alunos, tento nunca deixar que desistam… Acho que é um estilo muito próprio. 

RB Como lida com a diferença de estilos entre os seus alunos?
PIS Lido de uma forma que gosto que lidem comigo, tanto pessoal como profissional. É um estilo de muito respeito. Imagina, estamos a falar de banda desenhada. Se eles gostam de anime, não os contrario, nem sequer digo que não podem desenhar anime. Aquilo que tento dizer aos meus alunos é que eles têm de experimentar um bocadinho de tudo para perceberem o que de facto gostam de fazer. Então aí é uma questão de respeito. Respeito a forma de desenhar deles, o facto de uns gostarem de desenhar mais a preto e branco, outros mais colorido…  uns com mais risco, outros com poucas linhas, respeito isso. A partir do momento que determinem qual é o estilo e a forma de desenhar deles, tento que melhorem, melhorem,  melhorem!  Quando se contraria alguém, não reage bem, por isso temos de ir um bocadinho ao encontro do aluno e tentar mostrar que há outras formas de desenhar. Temos de ser abertos…nós os artistas temos que sair de dentro da nossa caixinha!

GF A professora, na sua juventude, tinha outro plano para o futuro ou sempre quis seguir Artes visuais? (se tinha) Quais?
PIS Na altura já sofria um bocadinho de uma mente aberta: gostar de tudo. Quando entrei no 9.º ano para o curso técnico profissional era eletrotécnica ligada com sistemas informáticos  Eu gostava, gostava da área de informática e lá fui eu… E adorei, em primeiro lugar era a única rapariga na turma, era apaparicada por todos os colegas. Era protegida… Foram três anos assim maravilhosos com um grupo de colegas e amigos maravilhosos. Gostei daquilo que fiz.  De facto há sempre um bichinho dentro de nós e esse bichinho é o das artes! E algumas vezes ficamos um bocado acomodados àquilo que temos e não decidimos dar asas às nossas vontades. Talvez porque os meus pais gostassem que eu fosse a senhora engenheira, não é? Ainda havia um bocado aquela ideia de que os artistas não faziam nada na vida! Estamos a falar do problema das pessoas acharem que todos acabaríamos na miséria. [Estamos a falar de há quase trinta anos atrás]. Havia esse preconceito. Posso dizer que, quando comecei no 10.º ano, se calhar um bocado com a cabeça formatada pelo que nós ouvimos falar, pela cabeça dos outros. O meu bichinho queria fazer aquilo que gostava, que me fazia sentir realizada… dei ouvidos ao meu interior, às minhas vontades… e disse que queria seguir aquilo que gostava, que me fazia sentir realizada. E fui para artes, nunca mais saí de lá e agora é o que faço.

RB Já exerceu ou exerce alguma outra atividade profissional em alguma outra área (se sim) qual?
PIS Acho que já contei algumas vezes aos meus alunos… No nono ano chumbei e o meu paizinho disse-me assim: “minha filha, passaste o ano inteiro de férias… o teu trabalho era estudar e não estudaste, vais trabalhar nas férias!” E fui trabalhar. Fui trabalhar para um supermercado. E a partir daí gostei imenso de trabalhar.  Gostei da ideia de ter o meu dinheiro ao fim do mês e de não depender financeiramente dos meus pais para ter isto ou aquilo, porque já tinha o meu dinheiro. Nunca mais parei de trabalhar. E então comecei a trabalhar na área do comércio, de lojas de roupa. Inicialmente, trabalhei somente nas férias, depois passei a trabalhar em part-time, a fazer o fecho de loja, nos centros comerciais. Mais propriamente, numa cadeia de lojas de uma marca internacional, na qual acabei como gerente de uma das lojas, a ter que ir escolher as coleções da roupa ao estrangeiro, a fazer vitrinismo na cadeia das lojas, no Porto… Por isso, trabalhei na área de moda, e da fotografia… Relativamente à pouco tempo, abracei um novo desafio: desenhar uma coleção de sapatos para um nicho de mercado muito específico. Não disse que não e no final do ano 2019, vi os meus desenhos ganharem vida! E como designer gráfica, sou sócia num gabinete, trabalho na área da publicidade e ilustração. E não tenho tempo para trabalhar em mais nada (risos!)…porque o dia só tem 24 horas! E como trabalho a fazer o que realmente gosto, o meu relógio não tem ponteiros!

GF Tem trabalhos publicados?
PIS Tenho trabalhos publicados na rua, ou seja, o meu trabalho é feito para o exterior. Tenho catálogos, tenho a coleção de sapatos. A nível de trabalhos gráficos, tenho trabalho realizado com a câmara do Porto, com a Sonae, com editoras, na paginação dos livros escolares, com lojas de pequeno comércio (idealização de linhas gráficas, nomeadamente, o cartão de visita, o reclame luminoso, a publicidade em catálogos, na internet, num jornal ou numa revista). Trabalho muitas vezes em parceria com informáticos: eles fazem a parte de informática e eu faço a parte do layout. Tenho trabalhos publicados, tenho sim.

RB Quer falar de algum em especial?
PIS Gosto muito de uma área específica, que é a área da ilustração. Fiz ilustrações para a Câmara de Santo Tirso, para um livro, na altura em que surgiu a reciclagem os 3R’s e para alguns livros infantis de apoio ao tema. Gostei muito do trabalho que fiz, também em parceria, para a câmara do Porto. Era o catálogo para os “passeios de primavera”, passeios lúdicos que se realizavam aos sábados e domingos, ao longo das margens do rio Douro, com historiadores bastante conhecidos. Foi um trabalho muito enriquecedor, pois não se tratou só de trabalho de gabinete. Tive o prazer de falar e acompanhar os historiadores/escritores em pré passeios, de fotografar os momentos e de utilizar esses registos fotográficos. 
Todos os trabalhos que faço, grandes ou pequenos, mais rentáveis ou menos rentáveis, têm um pouco de mim por isso é-me muito difícil dizer que gosto de um trabalho em específico. Eu gosto deles todos!

GF Desde quando trabalha como docente?
PIS Dou aulas, no Ministério da Educação, desde 98, desde 1998. Desde o século passado. Já tenho um século de existência, sou um dinossauro!

RB Qual é a sua área de formação académica?
PIS A minha área de forma académica é design gráfico, fiz o Curso superior especializado em design, opção em comunicação visual, na Escola Superior de Artes e Design.

GF Existe alguém que admira nessa área? Se sim, quem?
PIS Existe! Há sempre uma coisa que costumo dizer: nada nada é inventado, já, tudo, foi inventado. Nós temos de recriar aquilo que foi inventado, mudar, alterar…reinventar!
Existe uma pessoa, entre outras, que para mim foi marcante. Foi alguém que chegou ao país quando estava a estudar na faculdade, no 2.º ano. Não falava português, era eu que traduzia as aulas para os meus colegas. Considero-o, como alguém que trouxe uma lufada de ar fresco ao design gráfico português, na área da tipografia. 
Após o conhecer tive a perceção de que o país estava estagnado em termos de design tipográfico. Tínhamos um design bonito, sem dúvida, mas era um design ainda pouco industrializado. E então, o Andrew Howard, trouxe uma visão completamente diferente, quer a nível de lettering/tipografia quer a nível de paginação… Ele trabalhava em Inglaterra, contactou e trabalhou com conceituados gabinetes. E conseguiu elevar-nos a um outro patamar.
Para mim, a nível do design gráfico, tipografia, é um deus! Embora existam nomes marcantes de design português, de quem muito aprecio os trabalhos. 

RB Qual é a melhor parte de ser professora? E a pior?
PIS Isso é uma pergunta danada, gente! 
A melhor parte é o contacto, que neste momento não é possível o contacto físico, é o puder olhar e ver mais longe... Estar em frente, ou de frente, para 20, 30 cabeças pensantes, completamente diferentes!, e conseguir chegar ao fim de uma aula feliz, mais realizada. É teres alguém que fala se calhar te fale 25 anos  depois e que lembra de ti e se lembra daquilo que tu disseste na primeira aula que tiveste com essa pessoa. Isso é a parte fabulosa de ser professora! É conseguir ensinar, mostrar coisas novas, captar a vossa atenção!
A parte em que a professora vai ter de quantificar um aluno é a mais difícil, é a pior parte. Avaliar a sabedoria de um aluno em números é difícil…

GF sabendo que a professora é uma docente da área de artes visuais, já deve ter visitado vários museus. Tem ideia de quantos? Qual foi o que mais gostou?
PIS Quantos museus já visitei…  é assim, quantos?, perdi o número… se foram 100, 500 quantos são não consigo dizer.  Mas já foram muitos. Nós só crescemos quando começamos a olhar para o lado. Se olharmos para aquilo que fazemos e só para nós, não saímos do sítio. Adoro os museus aqui em Portugal, temos agora MAAT, em Lisboa que é lindíssimo, a casa de Serralves, aqui, no Porto e tantos outros... Temos lá fora os Guggenheim’s, dos quais sou fã. Em Paris, que a cada passo tem um museu famoso, o Louvre, o Museu de Orsay, Musée Rodin, o centro Pompidou e quantas galerias de arte!.  E depois Espanha… Madrid e Barcelona, não descurando outras cidades, … é infindável. Mas se calhar, o país que me disse mais a nível das Artes foi de facto em Itália. Itália é um tropeçar em Arte. A cada passo esbarras numa estátua..inebriante! Sou uma apaixonada por viagens…e não me calo!
 Se calhar aquele museu assim que marcou mais foi o Guggenheim, em Bilbao, pela sua arquitetura! O edifício… as suas curvaturas… a sua luminosidade… é maravilhoso! 
A nossa Casa de Serralves, vamos fazer publicidade ao que é nosso, é lindíssima, uma agradável surpresa que nos trouxe coisas muito novas para o Porto. Mesmo o nosso Museu Soares dos Reis, já antiguinho, mas com obras lindíssimas. Sei lá, tantos, não vos consigo quantificar, sequer. 
Visitem museus, que vos faz bem!

RB Qual foi o primeiro que visitou? Já era professora nessa época?
PIS Não, ainda nem sonhava ser professora… sempre que ia passear com os meus pais, não era só para ir ver a paisagem. Quando íamos, fosse dentro ou fora do país, os meus pais tentavam sempre fazer com que nós fossemos ver mais do que a paisagem. E por isso é que eu não te sei dizer, se calhar foi, acho eu, o Museu dos Coches em Lisboa.  O antigo, não este atual. Eu acho que sim…

GF Qual o movimento artístico que mais gosta? Porquê?
PIS  Art. movimento muito revolucionário, movimento completamente diferente, movimento que saiu da caixa pela cor pela simplicidade. Por esses motivos.

RB Há alguma questão que não lhe tenhamos colocado e gostasse de abordar?
PIS O meu pintor preferido, não perguntaram... Mas também acho que é um bocado difícil dizer porque tenho muitos! Mas acho que Salvador Dali, pelo seu chamamento excêntrico, Picasso pela sua diferença, Van Gogh pelas suas cores (os azuis que acho maravilhosos), Armanda Passos, pela forma de pintar…e por ser portuguesinha, a Paula Rego, também, embora seja assim um tipo de desenho que mexe um bocado comigo, uma pintura forte, mesmo.
De resto,… não!, parece que vocês quiseram saber tudo, vida e obra. Já disse muita, muita coisa…se calhar de mais, mas adoro falar com os alunos!

GF Agradecemos muito a sua amabilidade e as respostas que nos deu. Serão uma inspiração para todos nós. Gostamos muito de a conhecer.
PIS Muito obrigada pela vossa simpatia. Pela forma como colocaram as perguntas e me terem dado a oportunidade de falar um bocadinho de mim. Obrigada! muita arte e nunca desistam!

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